3 de janeiro de 2012

Governo do DF em busca do tempo perdido


O governo de Agnelo Queiroz está mal, mas ele garante que agora vai!

Talvez Agnelo Queiroz tenha se lembrado, como ex-militante do PCdoB, do presidente chinês Mao Tsetung. Em entrevista ao Correio Braziliense, o governador prometeu um “grande salto” em 2012. Mao não foi muito bem-sucedido em seu “Grande Salto à Frente”, em 1958, mas Agnelo não tem opção: ou esse salto dá certo e representa uma virada radical em seu governo, ou se afunda política e eleitoralmente. E o PT, por tabela, se afunda com ele.
Agnelo deve estar preocupado. Qualquer governante se preocuparia ao constatar que sua gestão é aprovada, quase um ano depois da posse, por apenas 15,4% dos eleitores. E que a soma dos que acham seu governo ótimo e bom não passa de 10%, enquanto 64% o consideram ruim e péssimo. Os números referentes ao governo de Agnelo Queiroz são de uma pesquisa confiável, do instituto O&P Brasil – aliás, um dos poucos confiáveis em Brasília.
Qualquer governante se preocuparia com esses números, pelos danos que causam à sua imagem e à sua gestão e pelo que podem representar nas eleições de 2014. Mas em três anos de mandato muita coisa ainda pode acontecer e um quadro negativo, mesmo tão negativo quanto este, pode ser revertido se houver vontade e competência para dar o tal “grande salto”. Mas que tem de ser dado logo, rapidamente.
Eleitores frustrados
Agnelo, na entrevista a Lilian Tahan, do Correio Braziliense, atribuiu seu mau desempenho em 2011 ao fato de assumir o governo “em uma situação dramática”. O ano, segundo ele, “foi de arrumação”, de enfrentamento de “situações emergenciais”. É uma explicação, com alguns contornos de razão, mas não é tudo. Os maus resultados podem também ser atribuídos às denúncias referentes aos tempos de Agnelo como ministro do Esporte e às suspeitas de que ainda existem coisas erradas no governo do DF pós Caixa de Pandora. Essa interpretação é reforçada com um dado relevante da pesquisa: 63,7% dos eleitores acham que Agnelo deveria se afastar do governo por causa das denúncias. Desses, 33,4% defendem o afastamento definitivo e 30,3% o temporário, voltando à função caso nada seja provado contra ele.
Ou seja, as denúncias pegaram. A postura de Agnelo ao se calar e mesmo ao se defender raivosamente não ajuda, pois passa a ideia de prepotência, arrogância. Não cria simpatia por ele, como possível vítima de injustiças. Pelo contrário, a população fica com o sentimento de “aí tem coisa”. O que, é claro, não o ajuda a superar o episódio e seguir em frente. A impressão que se passa é de que as denúncias já feitas e as que se diz que serão feitas intimidam e paralisam o governo.
As denúncias e as suspeitas, assim, pesam na avaliação dos brasilienses. Mas o que pesa mais é que o governo não conseguiu cumprir as promessas de campanha e atender às expectativas criadas com a proposta de um “novo caminho”. Não há percepção na população de que houve algum avanço nos métodos de governar, sequer que haja realizações a mostrar. A sensação dos brasilienses – e para constatar isso nem é preciso pesquisa, é só andar e conversar – é de que nada se faz, nada acontece e nada mudou substancialmente em relação aos governos anteriores.
Por isso os eleitores de Agnelo estão decepcionados, frustrados. No primeiro turno, em 2010, ele teve 48,4% dos votos. No segundo turno conseguiu dois terços: 66,1%. Votações muito expressivas e que por isso geram altas expectativas, pois um governante eleito com dois terços dos votos inicia seu governo com forte base popular. Mas o governador mal recebe hoje o apoio dos 24% de eleitores fiéis que seu partido, o PT, tem como base mínima no Distrito Federal. Pela pesquisa, Agnelo perderia a eleição para Joaquim Roriz e para “nenhum dos candidatos”, com apenas 22,1% dos votos. O “nenhum candidato” ganharia de Arruda e de Agnelo, que fica em último lugar com 21,8% dos eleitores.
Talvez Agnelo não acredite nos números da O&P, pode preferir ser iludido por institutos que trabalharam para os governos de Joaquim Roriz e de José Roberto Arruda, trabalham agora para ele e mantêm o hábito de não desgostar quem os contrata. Pode ser cômodo ouvir apenas bajuladores que o cercam e os que perdem a noção da realidade, imersos nos gabinetes e nos carros o ficiais do poder.
Mas deveria acreditar, e dar logo o grande salto.
Velhos métodos
No silêncio que geralmente mantém diante da opinião pública, quebrado pela entrevista insossa ao Correio, Agnelo justifica os problemas do primeiro ano e faz promessas formais como outras tantas já feitas – como a de que a saúde, agora, vai! –, sem tocar no básico: tem de virar seu governo de cabeça para baixo. Porque, do jeito que está, só mesmo com mudanças radicais de métodos, estrutura, prioridades, pessoas e comportamentos. Não é pouca coisa e, para isso, será preciso uma boa dose de autocrítica.
Verifique-se, nome a nome, a composição do governo de Agnelo. E, nome a nome, quem são os deputados que lhe dão sustentação na Câmara Legislativa. A conclusão é óbvia: em boa parte são os mesmos dos últimos anos, dos governos de Joaquim Roriz e José Roberto Arruda. Não haveria nenhum problema nisso, em princípio. Políticos podem mudar de postura, governos de coalizão têm de ser amplos. Os empresários que hoje apoiam entusiasticamente Agnelo são também os mesmos que bajulavam Roriz e Arruda. Mas aí é outra história: negócios são negócios.
Mas essa composição do governo e da base aliada não seria problema se, mesmo com essas presenças – algumas bem nefastas –, o governo de Agnelo mostrasse realmente um novo método de governar, um novo jeito de fazer política, um novo estilo de administrar. Se o governo mostrasse que enfrenta as dificuldades herdadas com dinamismo, ousadia e inovação. Esse seria o anunciado novo caminho.
Não é o que acontece, porém. Como os métodos e muitos nomes são os mesmos, o governo parece paralisado, refém de interesses que não sabe ou não tem como enfrentar. Agnelo tinha suficiente base popular para confrontar os interesses políticos e econômicos do passado e marcar um novo estilo. Era o que os dois terços dos eleitores, os que votaram nele, queriam. Mas começou mal, no velho jeito de fazer política, criando mais secretarias do que as muitas que já havia e loteando-as, assim como as administrações regionais, entre os parlamentares. Adotou os velhos e carcomidos métodos de se relacionar com a Câmara Legislativa e com os partidos, com base no fisiologismo, no patrimonialismo, no toma lá dá cá. Esse caminho, seguramente, não é novo.
Tal e qual governantes que o antecederam, Agnelo logo de início paralisou a máquina pública, exonerando todos os servidores comissionados de uma só vez. A medida seria positiva se significasse uma redução substancial das funções em comissão, o fim das indicações políticas e a rápida nomeação de técnicos competentes para os cargos realmente necessários. Mas não foi nada disso que aconteceu: continua o excessivo número de cargos de confiança, as indicações políticas dão a tônica do governo e é lento, muito lento, o preenchimento de funções técnicas por técnicos. Isso também não indica um novo caminho.
Possivelmente os brasilienses não dariam muita importância a essas questões se o governo mostrasse que está zelando pela cidade e realizando as intervenções necessárias para melhorar as áreas mais críticas para a população: saúde, segurança, transporte, trânsito, ordem urbana. Há realizações pontuais a serem creditadas ao governo, mas nada estrutural, relevante, que possa ser sentido pela população ávida por um novo caminho, que ainda não apareceu.
Aposta na Copa
Agnelo cometeu um erro primário na campanha eleitoral: prometeu o que não poderia prometer e, pior, o que não precisava prometer, pois a eleição estava ganha. Essa promessa se reflete até hoje na avaliação que as pessoas fazem de seu governo. O então candidato, que é médico, disse que assumiria pessoalmente a Secretaria de Saúde e resolveria os problemas da área em três meses. Nem assumiu a secretaria, nem resolveu os problemas.
Nem poderia resolvê-los mesmo, e ele sabia disso como profissional do setor e funcionário do sistema. A demanda por saúde pública é infinita, especialmente em uma metrópole como Brasília. Resolver seus problemas, ninguém resolve. Pode minimizá-los, reduzi-los, melhorar o nível de atendimento. Mas nem isso aconteceu.
Os brasilienses estão fartos de promessas não cumpridas, de marquetagem, de políticos que não conseguem dar respostas efetivas às denúncias que sofrem. Isso está demonstrado em pesquisas e se reflete na desconfiança com que Agnelo e seu governo de coalizão ampla, seguramente ampla demais, são vistos pela população.
Talvez ciente das fragilidades de seu governo, Agnelo optou por uma aposta arriscada: a Copa do Mundo. O torneio de futebol será em junho-julho de 2014 e Brasília é uma das cidades que sediarão jogos, inclusive da seleção brasileira. Se tudo der certo, haverá reflexos eleitorais positivos. Mas, e se der errado?
Descumprindo um discurso de campanha, Agnelo manteve a construção de um estádio com 70 mil lugares, projeto iniciado por Arruda. O então candidato havia dito que 40 mil assentos seriam suficientes. Os 70 mil lugares eram fundamentais para que Brasília fosse o palco do jogo de abertura da Copa, o que não acontecerá. Agora são essenciais para que Brasília receba jogos da seleção brasileira.
Nessa aposta pela Copa, Agnelo está declaradamente gastando R$ 671 milhões na construção do estádio, mas, na verdade, o gasto chegará a algo como R$ 1 bilhão, pois o valor anunciado não prevê a cobertura, o gramado, os assentos e a urbanização da área externa. Segundo a consultoria BSB – Brunoro Sport Business, o estádio de Brasília se pagará, em um cenário otimista, em 36 anos e meio – e isso custando apenas os irreais R$ 671 milhões. No cenário pessimista, em 167 anos. Outra consultoria, BDO RCS, estima que um estádio que custe R$ 700 milhões pode gerar um faturamento bruto de R$ 140 milhões por ano, com lucro líquido de R$ 13,5 milhões.
Se a construção do estádio vier acompanhada de outras realizações de peso, que realmente melhorem a vida dos brasilienses, os gastos com a obra serão bem absorvidos pela população. Mas, se pouco ou nada avançar nas áreas fundamentais, como saúde, segurança e transporte, certamente o forte candidato a elefante branco será um ônus pesado para Agnelo.
Na esteira da aposta para a Copa, Agnelo enfrentou outro desgaste: a insistência em ocupar a 901 Norte com um complexo de torres de até 18 andares, destinado a hotéis, escritórios e centros comerciais. A decisão, também herdada do governo de Arruda, violava claramente o tombamento da cidade, tema caro a muitos dos que votaram em Agnelo. Mas era importante para financiar a construção do estádio com recursos da Terracap, que venderia o lote por cerca de R$ 900 milhões a uma construtora.
Não deu certo, pois o Iphan vetou o projeto, como se esperava. E assim Agnelo desgastou- se à toa com um segmento importante da população, pois passou a ideia de não se importar com o tombamento do Plano Piloto e de querer agradar às construtoras tidas como responsáveis pela especulação imobiliária que degrada a cidade. O que também não é, certamente, um novo caminho.
Vai ser preciso mesmo um grande salto. Só um pulinho não vai resolver.
Por: Hélio Doyle heliodoyle@meiaum.com.br
Fotografia Thyago Arruda thyagochs@gmail.com
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